Mulheres e jovens são mais afetados por depressão e ansiedade na pandemia.
Estudo comparou dados referentes à realidade de 2020 e a um cenário sem Covid-19. Em países mais atingidos pela pandemia, houve uma pior deterioração da saúde mental.
Modelos matemáticos sugerem que, sem a pandemia, o ano de 2020 teria registrado 193 milhões de casos de depressão no mundo inteiro. Em vez disso, esse número foi de 246 milhões. Olhando apenas para transtornos de ansiedade, seriam 298 milhões; a quantidade real, porém, foram 374 milhões. E ambos os aumentos impactaram a população de forma desigual, sendo jovens e mulheres os grupos mais afetados, conforme revela um artigo publicado no periódico The Lancet nesta sexta-feira (8).
Os dados fazem parte do primeiro estudo global sobre os impactos da pandemia de Covid-19 na saúde mental que quantifica a prevalência dos transtornos depressivo e ansioso por idade, sexo e localização, contemplando 204 países. Até agora, as pesquisas haviam sido realizadas somente em locais específicos e durante curtos períodos.
O crescimento no índice de depressão devido à pandemia foi de 28%, com 53 milhões de casos a mais, sendo 35 milhões identificados em mulheres e 18 milhões em homens. A ansiedade subiu 26%, com 76 milhões de casos adicionais na comparação com uma situação sem pandemia. Desses, 52 milhões são de mulheres e 24 milhões, de homens.
“A pandemia exacerbou muitas desigualdades existentes e determinantes sociais ligados à saúde mental”, diz a pesquisadora Alize Ferrari, da Escola de Saúde Pública da Universidade de Queensland, na Austrália. “Infelizmente, por muitas razões, mulheres sempre foram mais propensas a serem mais prejudicadas pelas consequências sociais e econômicas dessa crise. Responsabilidades domésticas e de cuidado tendem a cair sobre mulheres. Além disso, elas são vítimas mais prováveis de violência doméstica, que aumentou em diversos estágios da pandemia”, explica.
O trabalho mostra ainda que essa elevação atingiu com maior intensidade os territórios onde as taxas de infecção pelo coronavírus foram mais altas e nos quais houve grande redução de movimentação em decorrência das medidas de distanciamento (como lockdown e fechamento de escolas).
Outro aspecto observado diz respeito aos mais jovens, que tiveram a saúde mental mais prejudicada do que os mais velhos. A prevalência adicional foi mais expressiva entre indivíduos de 20 a 24 anos: foram 1.118 casos a mais de depressão e 1.331 a mais de ansiedade a cada 100 mil pessoas dessa faixa etária. Esses valores declinaram com o aumento da idade. “O maior risco de desemprego e as restrições que limitam a capacidade dos jovens de aprender e interagir com colegas fizeram com que esse grupo fosse mais afetado”, comenta Ferrari.
Se antes da pandemia o cenário global dos transtornos depressivo e ansioso já era preocupante, agora os dados indicam que a ação de governos é urgente. “Na maioria dos países, os sistemas de saúde mental foram, historicamente, subfinanciados e desorganizados. Atender à elevada demanda impulsionada pela Covid-19 será desafiador, mas não agir não é uma opção”, defende o pesquisador Damian Santomauro, da Escola de Saúde Pública da Universidade de Queensland.
“Os esforços para aprimorar os serviços de apoio deveriam se concentrar em promover o bem-estar mental, focar nos fatores que contribuem para a deterioração da saúde mental e melhorar o tratamento para quem desenvolve um transtorno mental”, afirma Santomauro.
Além disso, os responsáveis pelo artigo reconhecem que, em função da falta de dados de boa qualidade, o trabalho apresenta uma limitação quanto aos efeitos da pandemia na saúde mental de vários países, especialmente aqueles de renda baixa ou média. A maioria das informações disponíveis apenas estimava os prováveis casos de depressão e ansiedade. Por isso, são necessários dados mais representativos da população para que haja uma melhor compreensão das consequências da crise sanitária em determinados locais.
Fonte: revistagalileu.globo.com