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“O Congresso é machista”, diz Erika Hilton

Publicada em 11/06/24 às 13:02h - 62 visualizações

por AÇAÍ VIP


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 (Foto: AÇAÍ VIP)

Depois de breve afastamento de Brasília para uma rinoplastia, da qual saiu com semblante mudado, atiçando as implacáveis redes, a deputada federal Erika Hilton, 31 anos, está de volta à cena, demarcando um terreno em que ela própria representa um avanço notável — é a primeira parlamentar transexual (junto da colega Duda Salabert, PDT-MG) a ocupar tão alta tribuna. No posto de líder do PSOL-Rede, Erika quer dar visibilidade a bandeiras que vem arrastando aos holofotes desde os tempos de ativismo estudantil na faculdade de pedagogia e, mais tarde, como vereadora em São Paulo, pleito em que foi campeã nacional de votos. Transfobia e violência de gênero estão no rol de suas pautas, as quais defende em meio às hostilidades de alguns membros do Congresso, que sente na pele. Nascida em Franco da Rocha, na região metropolitana paulista, ela revive nesta entrevista a VEJA o momento em que se entendeu como trans, o que viria a produzir uma fissura familiar, levando à sua expulsão de casa e à prostituição nas ruas. De fala ligeira e afiada, a deputada, recém-contratada por uma agência de modelos, não poupa nem a esquerda, onde também vê germinar o preconceito. “Ele está por toda a parte”, dispara.



Como foi recebida em Brasília, ao estrear como deputada federal em 2023? De forma bastante hostil, comportamento que reflete uma instituição majoritariamente masculina, branca e que não é só machista, mas LGBTfóbica. É verdade que, à medida que conquisto meu espaço, essa barreira, alimentada por estereótipos, vai mudando. Mas há setores na Câmara, como o da extrema direita, intolerantes e barulhentos, que só querem criar obstáculos a pessoas como eu, dentro e fora do Parlamento.

Como reage às provocações dessa ala mais radical? Sou adepta de uma relação republicana, mas, em muitos casos, é impossível. A única forma de lidar com essa turma movida por ódio, preconceito e mentiras é pelo enfrentamento.

A senhora está processando o deputado Pastor Sargento Isidório (Avante-BA) por ele ter chamado transexualidade de “fantasia” e se referido à senhora em plenário como “meu amigo”. Foi alvo de outras manifestações do gênero? Essa foi a mais explícita, mas elas são recorrentes. Em setembro, um ataque partiu da deputada bolsonarista Coronel Fernanda (PL-MT), que numa sessão alegou que pessoas trans estão roubando o lugar da mulher de verdade. Em outro episódio, Nikolas Ferreira (PL-MG) usou uma peruca e fez discurso transfóbico no Dia Internacional da Mulher. Por esse tipo de pensamento, demoramos tanto a ingressar no Congresso.

A senhora já declarou que “viu a desumanidade de perto”. Como? Senti na pele o desprezo do Estado. Ainda somos invisíveis na sociedade e mortas de forma gratuita, sem que ninguém se compadeça. A droga, o cárcere e a marginalidade são comuns em nossa trajetória. Experimentei a dor da evasão escolar e da violência policial. É desumano.


“Passei a adolescência na prostituição. É algo compulsório para mulheres como eu no Brasil. E há uma hipocrisia aí: as mesmas pessoas que dizem nos odiar consomem o mercado trans”


Em que ponto da vida se reconheceu como trans? Desde sempre me entendi assim, ao contrário de muita gente que, em certa hora, enfrenta um processo de discordância com relação a roupas, aparência e identidade. Fui criada num lar matriarcal, com mãe solo, avó e tias que me aceitavam e me criaram como menina. Apesar disso, encarei uma fase dolorosa na adolescência. Tudo mudou quando minha mãe passou a frequentar uma igreja evangélica e experimentou uma radical lavagem cerebral.

Morou mesmo na rua? Sim. Com uns 14 anos, fui expulsa de casa e conheci a brutalidade das ruas. Não tinha emprego, nem para onde ir. Nesse período, minha mãe dizia que não poderia me aceitar como travesti, que não era coisa de Deus, era contra a natureza humana. A ruptura familiar, a rejeição e a ausência de oportunidades causaram muita dor. Foi o fundo do poço.

Pode contar um pouco do que passou nessa fase? Atravessei a adolescência na prostituição. Fiz ponto nas calçadas de Jundiaí, Francisco Morato, Itu e também na capital. A prostituição é algo compulsório para mulheres como eu no Brasil — 90% trilham esse caminho, sem outra opção. E há uma hipocrisia aí: ao mesmo tempo que nos odeiam e matam, consomem o mercado de mulheres trans e travestis. São pais de família, evangélicos, padres, pastores. Felizmente, depois de uns sete anos, resgatei a relação com minha mãe e voltei para casa.


Nos últimos anos, a esquerda abraçou a bandeira das lutas identitárias. É um espectro político livre de preconceitos? A discriminação e a intolerância estão em todos os lugares. A esquerda não é um grupo político feito só de anjos ou de pessoas que vivem em Marte. Ela reúne valores variados e, sim, também lá se vê preconceito contra trans e travestis.

Guilherme Boulos, de seu partido, é pré-candidato à prefeitura de São Paulo com a chancela de Lula, e, nos bastidores do poder, dizem que o PSOL corre o risco de ser engolido pelo PT. Teme que aconteça? Acredito que não. Neste momento, integramos a base do governo Lula no Congresso e formamos uma frente de esquerda para avançar naquilo em que acreditamos.

O PSOL não se sente desprestigiado ao ocupar postos de menor relevância na Esplanada, enquanto legendas do Centrão desfrutam de protagonismo? Não enxergo assim. Claro que ter assentos na política é importante, mas o nosso compromisso não é baseado em cargos. A política é uma arena dura, na qual é necessário tecer acordos. Às vezes, é preciso dar um passo atrás para, mais tarde, poder avançar três.

Há poucas semanas, a polícia finalmente deu nome aos mandantes do assassinato de Marielle Franco, um quadro em ascensão no PSOL. Como viu o desfecho? Após seis anos, essas notícias trouxeram um misto de alegria e alívio ao saber que, enfim, a Justiça pode ser feita. Mas as investigações precisam continuar. Há coisas debaixo dessa história ainda por ser esclarecidas. Aliás, neste momento, uma das discussões mais duras na Casa é em torno da cassação do deputado Chiquinho Brazão (ex-União Brasil), envolvido no assassinato. Não dá para ele seguir como parlamentar. Temos que combater o corporativismo.

Em outubro de 2023, um irmão da deputada Sâmia Bomfim, também do PSOL, foi morto no Rio de Janeiro ao ser confundido com um miliciano. Qual sua visão sobre a promiscuidade entre a bandidagem e o Estado? É repugnante. Esses laços não são exatamente uma surpresa, mas choca saber o quão escancarados eles estão, como nos mostra o caso de Marielle. Revolta ver que o Estado não se encontra apenas alinhado, mas atua junto com essas facções — um mal que precisa ser combatido com toda a seriedade.

A senhora foi uma das vozes mais ativas contra integrantes da Comissão de Previdência e Família que tentaram proibir o casamento homoafetivo no país, um direito já adqui­rido. A ameaça de retrocessos continua? A ameaça é full time, em tempo integral. Justamente por isso é tão vital que representantes LGBT se façam presentes em espaços de relevo, como o Congresso.

Em um episódio de grande repercussão, o pastor André Valadão, fenômeno no mundo evangélico, disse aos fiéis que, se pudesse, “Deus mataria” a população LGBTQIA+ e os instigou a “ir para cima” deles. Aí reside um perigo real? Sem dúvida, é perigosíssimo. Quando essas pessoas agem assim, desencadeiam o aumento da violência e a negação dos direitos dos LGBTs. Não podemos aceitar que, em nome de Deus, se propague o ódio. Isso não é fé, é crime.

A senhora apresentou um projeto de lei para que a terapia de “conversão sexual”, a chamada cura gay, seja equiparada a crime de tortura. Ela ainda se faz muito presente? Sem dúvida. O extremismo à direita impulsiona essa distorcida ideia da cura, uma prática criminosa. Só se convence uma pessoa de que ela não é aquilo que é com violência, tortura. Os exemplos de “conversão” são cruéis.

“O novo modelo de RG adotado pelo governo Lula faz parte de uma política preconceituosa. É constrangedor ter de preencher o item ‘sexo’ e ainda escrever o nome de batismo”

Por que critica o novo RG recém-lançado pelo governo Lula? Este modelo faz parte de uma política preconceituosa, é uma herança da gestão passada. Ele obriga a preencher o item “sexo” e usar dois nomes, o social e também o de batismo, o que automaticamente constrange pessoas trans e travestis. Se o nome é ratificado no cartório, só há um, né?

Ao encampar um discurso radical contra a comunidade LGBTQIA+, o governo Bolsonaro deixou sequelas duradouras? É indiscutível. Ele não criou a roda, mas se valeu de coisas que já existiam na sociedade contra tal parcela da população, como estigma, ódio e violência, aprofundando a ferida social.

Mesmo com toda a visibilidade alcançada na luta contra o preconceito, ainda é alvo de ameaças por sua identidade de gênero? O tempo todo. O caso mais grave aconteceu quando eu era vereadora e um homem, que me fazia ameaças de morte na internet, tentou invadir o gabinete se passando por garçom. Os seguranças tiveram que detê-lo. Ainda recebo vários ataques nas redes. Falam de tudo — da minha identidade de gênero, do cabelo, da cor. Processo os mais graves e, nos outros casos, sigo a vida.




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